Para uma abordagem
correcta da problemática em questão há que fazer determinadas indagações
prévias. Em primeiro lugar, note-se que o Direito do ambiente é o sector
normativo que se ocupa da prevenção, da manutenção e da reparação dos factores
ambientais relativos ao Planeta Terra. A tutela do ambiente é uma realidade
recente, prejudicada pela proliferação de regras específicas, sem qualquer preocupação
de articulação conjunta[1];
a defesa do Ambiente é feita com recurso a normas oriundas dos mais diversos
ramos normativos, como o Direito Constitucional, Administrativo, Penal, ou
mesmo Civil (esta tutela faz-se tendo em conta as vantagens que resultem deste
regime face a uma perspectiva ambientalista). É de salientar a interdependência
entre a vida e o ambiente, pois sem o Direito do ambiente não há futuro algum.
Constate-se, ainda, que o Direito
Privado do Ambiente permite a qualquer particular intervir, por si, em questões
ambientais e assegura um papel deveras conformador de atitudes e formador de
mentalidades, algo extremamente necessário para uma tutela ambiental eficaz e
de futuro, pois a mudança cultural é uma das principais adversidades com que a
tutela do Ambiente se depara, podendo o Direito Civil desempenhar um papel
auxiliar fundamental nesta matéria. No entanto, as fraquezas estruturais do
Direito Privado em material ambiental (como por exemplo, o facto de ser,
tradicionalmente, um direito restitutivo e a tutela do ambiente dever ser
pautada por uma componente preventiva e salvaguardadora) determinam que este
não pode actuar principal ou exclusivamente na tutela do Ambiente. Ainda assim,
a necessidade de incrementar o Direito do Ambiente em nada priva as outras
áreas normativas; estas não devem ser preteridas ou sair prejudicadas, pois
face a uma necessária e urgente defesa dos valores ambientais, é premente
dispor de todos os mecanismos jurídicos disponíveis possíveis (ainda assim
escassos) para vencer a longa batalha pela defesa do Planeta.
A responsabilidade civil
relaciona-se com a ressarcibilidade de danos sofridos numa alçada jurídica, que
serão suportados por outrem. Tradicionalmente
alude-se a cinco pressupostos da responsabilidade civil: facto, ilicitude,
culpa, dano e nexo causal. A responsabilidade objectiva é excepcional, admitida
apenas quando os danos provocados forem independentes de culpa do agente. A responsabilidade civil
ambiental, tem como fundamento jurídico, o artigo 66º da CRP[2]. Os crescentes problemas ecológicos[3] que, por
todo o mundo se têm feito sentir, acompanhados de uma maior consciencialização
e preocupação ambiental, fizeram suscitar a questão da responsabilidade civil
ambiental.
O Decreto-Lei n.º 147/2008 de 29 de Julho (doravante LRCA) estabelece o
regime jurídico da responsabilidade por danos ambientais, assentando na Lei de
Bases do Ambiente, desenvolvendo a sua dimensão indemnizatória. Note-se que no
preâmbulo vêm expressos os Princípios da Prevenção e Reponsabilização: “(…) um
regime de responsabilização atributivo de direitos aos particulares constitui
um mecanismo economicamente mais eficiente e ambientalmente mais eficaz do que
a tradicional abordagem de mera regulação ambiental, comummente designada de
comando e controlo (…) os particulares (…) relativamente a um estado de
conservação ambiental (…) é preferível dotá-los de direitos indemnizatórios,
investindo assim o cidadão na qualidade de verdadeiro zelador do ambiente (…)”.
O preâmbulo fixa ainda cinco objectivos a superar: a dispersão dos danos, que
desincentiva o lesado de demandar o poluidor, numa análise custo/benefício; a
complexidade causal, susceptível de impedir a efectivação da responsabilidade;
a latência das causas, que leva ao surgimento do dano muito depois do facto que
o originou; a dificuldade técnica de provar que uma causa é apta a produzir um
dano e a garantia financeira da capacidade do poluidor para suportar os danos
da reparação.
O sistema de responsabilidade civil
previsto na LRAC tem de lamentar a auto-contenção legislativa, que obriga a
invocar (ainda que meramente a título subsidiário) o regime geral de
responsabilidade civil. O regime de responsabilidade civil por dano
ambiental admite várias
formas de compensação dos lesados, incluindo, em última análise, a possibilidade de uma indemnização. O capítulo II do regime regula
a indemnização de lesões sofridas por determinados indivíduos em concreto (a relação entre autor do dano e vítima está presente em
todos os artigos desta capítulo)[4].
Saliente-se
ainda que uma das maiores dificuldades no que respeita à responsabilidade civil
ambiental relaciona-se com a própria indagação do dano ambiental, onde muitas
vezes se conjugam diversos factores, quer de carácter natural (como a
influência dos ventos na emissão de poluentes, por exemplo) quer de carácter
humano, bem como as dificuldades provenientes da dilação temporal entre facto e
dano. Estes problemas fazem surgir a questão de se será a responsabilidade civil
ambiental um meio adequado de tutela (reintegradora ou reparatória por oposição
à tutela preventiva) do ambiente. Ainda assim, a responsabilidade civil não
deve ser negada, pois estando ligada à ideia de conservação do ambiente, esta
tem uma função ressarcitória, nomeadamente por permitir a reconstituição
natural (o que no domínio ambiental apresenta uma particular importância, pois
só assim se conseguirá colmatar o dano provocado e restabelecer o equilíbrio).
Para além disso, tem igualmente um carácter preventivo pois o agente que
potencialmente poderá provocar o dano estará de sobreaviso quanto às
consequências das suas acções prejudiciais. Nesta responsabilização está assim
também presente o princípio do poluidor-pagador.
Actualmente, devido a uma multiplicidade de
factores (como, nomeadamente, a complexidade da actividade económica) surgem
situações potencialmente geradoras de danos que tornam difícil a prova dos
pressupostos clássicos da responsabilidade civil subjectiva e, principalmente, a
culpa.
Dai o surgimento da responsabilidade objectiva[5], pois se alguém desenvolver uma actividade perigosa para a sociedade e através dessa actuação conseguir obter benefícios é legítimo que seja ele a suportar com os danos que causou mesmo que seja sem culpa (art.483/2 CC e art. 41 LBA[6]).
Dai o surgimento da responsabilidade objectiva[5], pois se alguém desenvolver uma actividade perigosa para a sociedade e através dessa actuação conseguir obter benefícios é legítimo que seja ele a suportar com os danos que causou mesmo que seja sem culpa (art.483/2 CC e art. 41 LBA[6]).
Foi neste seguimento que o legislador clarificou
quais as actividades consideradas de alto risco para o ambiente (estabelecendo
o DL 147/2008 contem listas das actividades consideradas objectivamente perigosas
para o ambiente no seu anexo iii).
Estabelece o art. 7.º da LRAC: “Quem, em virtude do exercício de uma actividade económica
enumerada no anexo iii ao presente decreto-lei, que dele faz parte integrante,
ofender direitos ou interesses alheios por via da lesão de um qualquer
componente ambiental é obrigado a reparar os danos resultantes dessa ofensa,
independentemente da existência de culpa ou dolo”.
O art 7.º da LRCA fixa os termos da responsabilidade objectiva por danos
ambientais, no entanto é diferente da responsabilidade objectiva civil, pois
dispensa a culpa mas não a ilicitude. O art. 10.º dá à responsabilidade civil
ambiental um alcance globalmente supletivo. Assim, infere-se que é necessária
uma necessidade de desenvolver um subsistema de responsabilidade civil
devidamente adaptado, pois atendendo ao art. 7.º da LRAC, refere-se um
exercício de actividade económica (enumerado no anexo III do diploma), algo
muito abrangente. Quanto aos “direitos ou
interesses alheios”, deve entender-se, nos termos gerais, “interesses protegidos”, que já estavam
tutelados no art. 483.º n.º 1 do CC. A única especificidade reside no facto de
uma causalidade especificamente ambiental (art. 5.º): a lesão de um qualquer
componente ambiental.
Quanto à ilicitude, por norma
surge um problema da colisão de direitos (atente-se ao art. 335.º CC). Releva
assim, a concepção de direito do ambiente como um direito fundamental, e as
possíveis consequências, no caso concreto, de condutas contraditórias ou
colidentes, inconciliáveis ou incompatíveis.
O art. 7.º da LRAC respeita a danos efectivamente provocados (sejam eles
danos ambientais ou ecológicos, ultrapassando-se, assim, a anterior destrinça).
Todavia nem sempre é susceptível a reparação natural do
dano, originando-se, nessas situações, uma indemnização. Mas note-se:
nem sempre o dano ambiental é susceptível de reparação, casos em que o agente é indeterminado ou o dano em causa tenha chegado a esfera da impossibilidade de ser recomposto, constatando-se, uma vez mais, a indispensabilidade da responsabilidade civil ambiental e de uma possível reparação pecuniária, ou seja, uma compensação em dinheiro.
nem sempre o dano ambiental é susceptível de reparação, casos em que o agente é indeterminado ou o dano em causa tenha chegado a esfera da impossibilidade de ser recomposto, constatando-se, uma vez mais, a indispensabilidade da responsabilidade civil ambiental e de uma possível reparação pecuniária, ou seja, uma compensação em dinheiro.
Como deve, então, ser imputado o dano ao
agente? Surge assim a problemática do nexo de causalidade na responsabilidade
civil ambiental, estatuindo o art. 5.º da LRAC: “A apreciação da prova do nexo
de causalidade assenta num critério de verosimilhança e de probabilidade de o
facto danoso ser apto a produzir a lesão verificada, tendo em conta as
circunstâncias do caso concreto e considerando, em especial, o grau de risco e
de perigo e a normalidade da acção lesiva, a possibilidade de prova científica
do percurso causal e o cumprimento, ou não, de deveres de protecção”.
A causalidade[7]
tem a ver com a lesão de componentes ambientais (causalidade ambiental, de base
naturalística alargada e isso independentemente de ser previsível pelo agente).
A imputação, segundo o art. 7.º funciona mesmo que a conduta não seja, nos
moldes comuns, censurável ao agente. A imposição de uma responsabilidade
objectiva visa incentivar à prossecução dos valores fundamentais em questão.
O nexo de causalidade assenta num critério de verosimilhança e de
probabilidade, que deve tomar em conta as circunstâncias do caso concreto, o
grau de risco e de perigo e a normalidade da acção lesiva, assim como a
possibilidade de prova cientifca do percurso causal e o cumprimento, ou não, de
deveres de protecção.
Logo: esta regra de responsabilidade civil ambiental visa adoptar um critério que tem como base um indício de
idoneidade do facto à provocação do dano, isto é, da possibilidade de aumento
ou materialização do perigo da conduta do agente ao Ambiente, com base na
Ciência e nas regras de experiencia, face ao caso concreto. No entanto, face
aos valores em jogo, e visto que a defesa do Ambiente é algo que preocupa e
concerne a todos, não teria sido má ideia o legislador estabelecer determinadas
presunções quanto à prova do nexo causal. O Ambiente, agredido, diariamente e
cada vez mais a um ritmo vertiginoso, assim o exige!
Bibliografia:
- CORDEIRO, António Menezes, “Tratado de
Direito Civil Português II - Direito das Obrigações Tomo III”, 2010, Almedina;
- GOMES, Carla Amado e ANTUNES,
Tiago, “O
que há de novo no Direito do Ambiente? : actas das jornadas de
Direito do Ambiente”, 2009, AAFDL;
- OLIVEIRA,
Ana Perestrelo de, “Causalidade e Imputação na Responsabilidade Civil
Ambiental”, 2007, Almedina
- SILVA, VASCO PEREIRA DA e
MIRANDA, João, “Verde cor de direito: Lições de Direito do Ambiente”, 2004, Almedina.
António Almeida
Aluno n.º 18025
Turma: A
Subturma: 7
[1] O
Direito do Ambiente, como disciplina normativa, coloca, assim, certos problemas
de sistematização.
[2] Note-se os arts.
1346.º a 1348.º do CC onde se determina o dever de abstenção de certas condutas
prejudicais no âmbito da poluição.
[3] Que acarretam, consequentemente, alterações ambientais e danos ao nosso Sistema
Ecológico, sendo necessário referir que, ao nível das agressões ao ambiente, a
preocupação e a necessidade de salvaguardar as gerações futuras e a ideia de
desenvolvimento sustentável implicam inevitavelmente a busca por um equilíbrio
ambiental.
[4] Quanto à obrigação
de indemnização atente-se ao preâmbulo de Decreto-Lei nº 147/2008 que determina que os “(...)operadores
-poluidores ficam obrigados a indemnizar os indivíduos lesados(...)”.
[6] São necessários três
pressupostos fundamentais da responsabilidade objectiva: é necessário que o
agente cause danos significativos ao ambiente, se verifique uma acção
especialmente perigosa para o ambiente e tem que ocorrer um nexo de causalidade
específico entre os danos e a acção praticada pelo agente.
[7] Saliente-se as
Teorias da causalidade adequada (só pode haver imputação do dano ao agente
quando o facto, para além de ser em concreto conditio sine qua non do dano,
seja, em abstracto, adequado a produzi-lo; assim, o facto tem não só de ser
imprescindível para a produção do dano, mas, para além disso, tem de, segundo
um juízo de probabilidade, ser idóneo a produzir o dano) e da conexão do risco
(a imputação do dano ambiental ao agente ocorreria quando a conduta deste levasse
à criação ou ao aumento de um risco não permitido pela fattispecie legal, sendo
o resultado ou evento danoso materialização ou concretização desse risco;
assim, a criação ou aumento do risco, só daria lugar a responsabilidade civil
se a conduta do agente fosse susceptível de provocar danos nos bens jurídicos
tutelados pelas normas jurídicas em causa).
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