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AVALIAÇÃO DE IMPACTO AMBIENTAL ENQUANTO COROLÁRIO DO PRINCÍPIO DA PREVENÇÃO
O princípio da prevenção é um dos dois
princípios fundamentais de Direito Ambiental que se antecipam à ocorrência do
dano ambiental. De facto, as agressões ao meio ambiente, uma vez consumadas,
são de reparação difícil e dispendiosa. Neste sentido, o princípio da prevenção
tem em vista assegurar a eliminação de perigos que já estão cientificamente
comprovados, traduzidos em riscos concretos e conhecidos.
Nesta matéria, estamos em face de bens
frágeis e muitas vezes não regeneráveis, pelo que a antecipação dos efeitos
lesivos sobre os mesmos é determinante. No entanto, na maior parte das vezes
não é possível evitar em termos totais essas lesões pelo que tem de haver uma
resignação à minimização desses danos. Assim, tem de haver aqui um juízo de
razoabilidade que contende com o princípio da prevenção no sentido de impedir
que o mesmo se traduza na evitação de todo e qualquer risco ou dano.
Tem de ser tida em conta a necessidade
do sujeito operador desenvolver a sua actividade no exercício do seu direito de
iniciativa económica. Deste modo, como refere Carla Amado Gomes, tem de ser
feita uma gestão racional de recursos naturais, de forma a que o principio da
prevenção não condene ao retrocesso económico e tecnológico a actividade
humana. Nas palavras da mesma autora “gerir racionalmente é gerir
preventivamente, não deixando chegar o bem ao limite da sua regenerabilidade ou
ao termo da sua existência (…) a gestão racional é dinâmica, podendo determinar
alterações às condições inicialmente colocadas à sua utilização”. Nos termos do
artigo 191º do tratado de Funcionamento da União Europeia, a política da união
no domínio do ambiente basear-se-á nos princípios da precaução e da acção
preventiva, na correcção na fonte dos danos causados ao ambiente, e no
princípio do poluidor pagador.
Corolário do princípio da prevenção é o
mecanismo de avaliação de impacto ambiental enquanto instrumento de gestão de
riscos e impactos negativos na esfera do meio ambiente.
A Avaliação de impacto ambiental é um
mecanismo que nasceu nos Estados Unidos da América nos anos 70, e que desde
então tem vindo a ganhar terreno no âmbito do Direito Internacional do
Ambiente. Hoje em dia são poucos os tratados internacionais reguladores da
matéria que não contenham disposições relativas à avaliação de impacto
ambiental.
A avaliação de impacto ambiental é um
conceito dinâmico que está em permanente mutação em consequência das constantes
alterações políticas em matéria ambiental.
Este mecanismo é uma ferramenta necessária
no que respeita ao processo de licenciamento de uma actividade possivelmente
nefasta para o ambiente, possibilitando uma informação mais concreta e
detalhada sobre os impactos ambientais daquela, permitindo assim que as
entidades responsáveis pela licença possam fazer um juízo de equilibro entre as
mais-valias económicas e sociais, por um lado, e os impactos ambientais por
outro, da forma mais informada possível. Deste modo, identifica-se como
objectivo principal deste mecanismo, a recolha da maior quantidade de
informação relativa aos possíveis impactos ambientais que possam advir da
actividade a licenciar, de forma a minimizar as decisões que possam ter
consequências negativas para o ambiente.
A avaliação de impacto ambiental tem
sido referida por alguma doutrina com sendo um princípio do costume
internacional. De facto, muitas têm sido as convenções de Direito Internacional
sobre a matéria, nomeadamente a convenção de avaliação de impacto ambiental num
contexto transfronteiriço (1997) e a convenção de Aarhus (1998), às quais aderiu
Portugal.
No âmbito da União Europeia (na altura
CEE), a Directiva 85/337CEE afirmou-se como instrumento catalisador da evolução
da União Europeia em termos de política ambiental, influenciando a adopção de
mecanismos de avaliação de impacto ambiental nos Estados Membros. Esta
Directiva respeitava à “avaliação dos efeitos de determinados projectos
públicos e privados no ambiente”, contendo nomeadamente uma norma relativa aos
impactos transfronteiriços que seria “accionada” quando um Estado Membro
tivesse conhecimento de um projecto que pudesse vir a ter efeitos
significativos no meio ambiente de outro Estado Membro, devendo a documentação
da avaliação de impacto ambiental ser enviada para o Estado Membro afectado,
servindo essa informação como base para as consultas necessárias à densificação
das relações bilaterais entre os dois Estados.
A Directiva 97/11 CE veio colmatar
algumas deficiências constantes da anterior Directiva 85/337 CEE. No seu artigo
7º, a primeira veio exigir um maior detalhe no que respeitava aos procedimentos
relativos aos impactos ambientais transfronteiriços, bem como estabelecer o ano
de 1999 como limite à implementação da mesma pelos Estados Membros.
No âmbito destas Directivas, o mecanismo
de avaliação de impacto ambiental é um instrumento fundamental da política
comunitária baseado no princípio da precaução, no princípio da prevenção e no
princípio do poluidor pagador.
Ao nível nacional, algumas
constituições, nomeadamente a Brasileira, consideram a avaliação de impacto
ambiental imprescindível à tutela do ambiente. De facto, a Constituição
Brasileira prevê a avaliação de impacto ambiental enquanto instrumento da
Política Nacional do Meio Ambiente, estabelecendo um conjunto de critérios,
competências, hipóteses, definições e directrizes gerais para a exigência dos
estudos de impacto ambiental e para o licenciamento de actividades no âmbito da
protecção ambiental, de forma a prevenir os possíveis efeitos adversos sobre o
meio ambiente causados por uma actividade que disponha de recursos ambientais.
A avaliação de impacto ambiental é assim
um meio de actuação preventiva do poder público que visa analisar previamente
os possíveis efeitos positivos e negativos que resultem da implantação,
ampliação ou funcionamento de actividades que sejam consideradas como
potencialmente causadoras de uma significativa degradação dos recursos
ambientais, determinando a existência de medidas destinadas a conformar e
adequar o empreendimento aos pressupostos de protecção e melhoria do meio
ambiente. No entanto, este procedimento não se afigura necessário em todos os
casos, sendo apenas obrigatório em situações determinadas em função da
interpretação de um conceito jurídico indeterminado (“em casos de significativa
degradação do ambiente”) pelas entidades públicas competentes.
Em Portugal, o Decreto-Lei nº69/2000 de
3 de Maio conformou a legislação nacional com os objectivos da União Europeia
em matéria ambiental, aprovando o regime jurídico da avaliação de impacte
ambiental dos projectos públicos e privados susceptíveis de produzirem efeitos
significativos no ambiente, constituindo, nas palavras daquele diploma, “um
instrumento fundamental da política de desenvolvimento sustentável”. Este Decreto-Lei
foi posteriormente alterado pelo DL 197/2005 de 8 de Novembro que transpôs para
a ordem jurídica interna a Directiva 85/337 CEE com as alterações introduzidas
pela Directiva 97/11 CE e pele Directiva 2003/35 CE (veja-se também a Directiva
2011/92/EU de 13 de Dezembro de 2011 relativa à avaliação dos efeitos de
determinados projectos públicos e privados no ambiente).
O Regime jurídico de avaliação de
impacto ambiental é aplicável a projectos públicos e privados susceptíveis de
provocar efeitos significativos no ambiente, nos termos do artigo 1º, nº2 do
RAIA. Este regime contém dois anexos que tipificam e enunciam os projectos
sujeitos a avaliação de impacto ambiental (art. 1º, nº3, als a) e b)). Estão
ainda sujeitos a esta avaliação aqueles projectos que embora não abrangidos
pelos limiares do anexo II do mesmo diploma, sejam ainda assim considerados
susceptiveis de provocar “impacte significativo no ambiente” em função da sua
localização, dimensão ou natureza, de acordo com os critérios estabelecidos no
anexo V (art.1º, nº4 RAIA), bem como aqueles “projectos que em função da sua
localização, dimensão ou natureza sejam considerados, por decisão conjunta do
membro do governo competente na área do projecto em razão da matéria e do
membro do governo responsável pela área do ambiente, sejam susceptiveis de
provocar um impacte significativo no ambiente”, tendo em conta os critérios
estabelecidos no anexo V (art.1º, nº5 RAIA).
O procedimento de avaliação de impacto
ambiental é público nos termos do artigo 22º, nº1 do RAIA.
Por iniciativa do proponente e mediante
despacho do ministro responsável pela área do ambiente e do ministro da tutela,
e em circunstâncias excepcionais e devidamente fundamentadas, o licenciamento
ou a autorização de um projecto pode ser efectuado com dispensa total ou
parcial do procedimento de avaliação de impacto ambiental, nos termos do nº1 do
art. 3º do RAIA. Esta dispensa constitui uma excepção ao princípio da prevenção
e por esse motivo é alvo de críticas por parte de Carla Amado Gomes que chama a
atenção para o facto da expressão “circunstâncias excepcionais” previstas no
nº1 do art.3º ser demasiado ampla, constituindo uma espécie de norma
habilitante em branco, o que dificulta o controlo dessa competência. Por outro
lado, para a autora a preterição da necessidade de apresentação de estudo de
impacto ambiental contraria o princípio de que é o preponente que deve
demonstrar a ausência de impactos relevantes associados ao projecto, remetendo
para a administração a carga de aferição dos riscos que aquele eventualmente
envolve. Para além disso, a ausência de uma referência à vinculatividade do
parecer da autoridade de avaliação do impacto ambiental previsto no nº4 do
art.3º do RAIA leva Carla Amado Gomes à conclusão de que o parecer daquela
autoridade é obrigatório mas não vinculativo.
Todos os projectos que se encontrem nas
condições previstas pelos artigos referidos terão de presenteados com uma
declaração de impacto ambiental favorável ou condicionalmente favorável nos
termos do art. 17º,nº1do RAIA. Esta declaração é da competência do ministro
responsável pela área do ambiente e deve ser proferida no prazo de 15 dias a
contar da data de recepção da proposta da autoridade de avaliação de impacto
ambiental (art. 18º, nº1 do RAIA). A declaração de impacto ambiental deve
especificar as condições em que o projecto pode ser licenciado e contém
obrigatoriamente as medidas de minimização dos impactes ambientais negativos que
o proponente deve adoptar na execução do projecto. Com a alteração ao regime de
licenciamento ambiental promovida pelo Decreto-Lei 173/2008 de 26 de Agosto,
passou a ser possível, por iniciativa do proponente, desencadear a avaliação de
impacto ambiental conjuntamente com o licenciamento ambiental.
O art.19º do RAIA prevê ainda a
possibilidade desta declaração poder ser deferida tacitamente se nada for
comunicado à entidade licenciadora no prazo de 140 dias para projectos que
integrem o anexo I, ou 120 dias no caso de outros projectos. No entanto, esta
possibilidade de deferimento tácito só vale para avaliações intrafronteiriças.
Para procedimentos de avaliação de impactos transfronteiriços (arts.32º e ss
RAIA) o legislador afastou a valoração do silêncio. Carla Amado Gomes diz a
respeito desta questão que “a solução do deferimento tácito é uma afronta ao
Direito Ambiental constitucional, legal e da União Europeia”, invocando a
violação dos princípios da prevenção, participação e imparcialidade.
Os actos de licenciamento de projectos
que estejam sujeitos a avaliação de impacto ambiental só podem ser praticados
após a notificação da respectiva declaração em sentido favorável ou
condicionalmente favorável, sob pena de nulidade (art. 20º, nº1 e 2 do RAIA).
A execução do projecto avaliado tem de
ser promovida num espaço de dois anos, passados os quais a declaração de
impacto ambiental caduca (art.21º, nº1 RAIA).
O projecto é ainda alvo de uma
pós-avaliação com vista a avaliar a conformidade do mesmo com os termos e
condições fixados na declaração de impacto ambiental, e ainda determinar a
eficácia das medidas previstas e do procedimento de avaliação de impacto
ambiental realizado (art.27º, nº1 RAIA). É necessário sublinhar que na
esmagadora maioria dos casos, a declaração de impacto ambiental é
condicionalmente favorável determinando certos deveres de facere que vêm previstos no acto autorizativo parcial, o que
implica a aposição de um conjunto de medidas de minimização do impacto
ambiental cujo cumprimento deverá ser observado, sob pena de aplicação de uma
contra-ordenação que pode eventualmente ser cumulada com uma sanção acessória
nos termos do artigo 38º do RAIA.
O regime jurídico de avaliação de
impacto ambiental prevê ainda um capítulo relativo a impactes transfronteiriços
que vem plasmado nos artigos 32º e ss. de acordo com o art.32º, “o Estado
Português deve consultar o Estado ou Estados potencialmente afectados quanto
aos efeitos ambientais de um projecto nos respectivos territórios e quanto às
medidas previstas para evitar, minimizar ou compensar esses efeitos, bem como
pronunciar-se quando, em idênticas circunstâncias, for consultado por outro
Estado”. O artigo 33º do RAIA dispõe especificamente sobre projectos com
impactos em outros Estados da União Europeia.
Nos termos do art.35º - A que integra o
capítulo V do RAIA, o público interessado tem a faculdade de impugnar a
legalidade de qualquer decisão, acto ou omissão no âmbito do procedimento de
avaliação de impacto ambiental, nos termos gerais de direito. O mesmo capítulo
prevê uma série de contra-ordenações e sanções que deverão ser suportadas pelo
infractor que desrespeite as disposições previstas no referido diploma ou que
dele resultem. O art. 39º do RAIA determina a obrigação para o infractor de
proceder à remoção da infracção e à reconstituição da situação anterior à
prática da mesma, sob pena de os serviços competentes do ministério responsável
pela área do ambiente actuarem directamente por conta daquele, sendo as
despesas cobradas coercivamente através do processo previsto para as execuções
fiscais. Não sendo a eliminação das causas da infração possível, o infractor
sob orientação da autoridade de avaliação de impacto ambiental, deve tomar as
medidas necessárias para reduzir ou compensar os impactos provocados, com a
consequência de poder vir a ser constituído na obrigação de indemnizar o estado
se não o fizer (arts. 40º e 41º do RAIA).
Bibliografia:
BELTRÃO,
António F. G., Aspectos Jurídicos do Estudo de Impacto Ambiental, MP Editora,
2008
BOWMAN, Adam e BOYLE, Alan, Environmental Damage in International and
Comparative Law – Problems of Definition and Valuation, 2002
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FIGUEIREDO,
Guilherme José Purvin de, Curso de Direito Ambiental, Curitiba-PR, 2008
GOMES,
Carla Amado, Introdução ao Direito do Ambiente, AAFDL, 2012
LEITE,
José Rubens Morato e PILATI, Luciana Cardoso, Direito Ambiental Simplificado,
Editora Saraiva, 2011
SILVA,
Vasco Pereira Da, Verde Cor de Direito, Lições de Direito do Ambiente,
Almedina, 2012
SIRVINSKAS,
Luís Paulo, Manual de Direito Ambiental, Editora Saraiva, 2012
Trabalho realizado por Inês Luís de
Oliveira, subturma 7, nº18165
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