O Direito do Ambiente constitui atualmente um
"ecossistema jurídico complexo"[1],
que envolve a emergência de forças oriundas de todos os países para se observar
resultados eficientes, isto porque a proteção do ambiente não se restringe
ao território de um estado, ou a uma região determinada, incide sim sobre recursos
cuja sua gestão repercute-se por todo o ecossistema, e podendo até dar azo ao surgimento de uma
lógica de classificação de certos bens como " património comum da humanidade"
e logo tenderia-se a impor a sua sujeição a uma gestão
internacional[2].
No entanto por questões de soberania dos estados e também, neste sentido, o conteúdo patente na declaração
de Estocolmo e Declaração do Rio, fizeram com que a soft law predomine no Direito
internacional do Ambiente, flexibilizando demasiado as normas prescritivas e
deixando sem sanção as violações das obrigações resultantes de convenções.
A evolução do direito eurocomunitário deste ramo teve uma infância pouco ciente dos problemas ambientais mas sempre numa
tendência evolutiva e cada vez se acentuando e impondo-se mais os objetivos, numa visão actualista consoante novos dados científicos.
O Tratado de Roma ignorava a proteção ambiental, o que é compreensível na medida em que inicialmente existiu apenas uma vertente
puramente económica da integração.
Esta emergência ecológica deve-se ao alarme
soado pela Conferência de Estocolmo, e que foi tomada em conta pelos chefes de
estado e de governo na Cimeira de Paris, em 1972, ultrapassando-se barreiras económicas
para se centralizar na promoção da qualidade de vida das populações dos
estados- membros [3].
Os Chefes de Estado e de Governo sublinharam a importância
de uma Política Comunitária de Ambiente e com este fim em vista, convidam as instituições
comunitárias a estabelecer antes de 31 de Julho de 1973 um Programa de Acção
acompanhado por um “calendário bem definido”. Pretende-se assim uma harmonização
de políticas ambientais, que tal foi formalizada pela mão do Acto Único Europeu
através de um título dedicado a política do ambiente no Tratado de Roma, e que
dão competência a comunidade para criar os objetivos e políticas ambientais[4].
Em 1998, com o Tratado de Amesterdão
é reforçada esta legitimidade da União para definição e execução de
metas, afirmando-se o principio da integração em sede de disposições introdutórias
no Tratado da Comunidade Europeia (actual artigo 11 do TFUE).
A Carta dos Direitos Fundamentais proclamada em
2000, inseriu o ambiente entre as tarefas da comunidade no seu art 37, onde se
apela ao desenvolvimento sustentável, (actuais artigos 3/3 e 11 do TUE ; 191 a
193 do TFUE). O entrosamento entre o ambiente e o desenvolvimento sustentável é
um dos traços mais marcantes do Tratado de Lisboa.
Embora a ideia de desenvolvimento sustentável não
seja inteiramente nova ao nível do direito comunitário originário (foi
introduzida pelo tratado de Amesterdão), com o Tratado de Lisboa esta
ganha uma importância acrescida, através da sua intersecção com a política
ambiental, que visam nomeadamente a luta contra alterações climáticas (domínio
onde a União tem de vindo a distinguir-se com a ratificação do protocolo de
Quioto em 2002); a estreita ligação que se vem estabelecendo entre proteção do
ambiente e promoção da utilização dos recursos renováveis com vista à geração
de energia, na produção de eletricidade e biocombustíveis; e observância de um
mecanismo de exercício da cidadania ambiental na Europa, fortalecido com a nova
possibilidade de iniciativa legislativa através do direito de petição coletiva[5].
No TUE o conceito de desenvolvimento sustentável aparece no 9º
Considerando do documento, no âmbito da realização do mercado interno, e do
reforço da coesão e da proteção do ambiente, com vista ao progresso económico e
social. Também no art 3º/3 do mesmo tratado, volta-se a insistir no crescimento
equilibrado e estabilidade dos preços numa economia que tenha como meta o pleno
emprego, o progresso social, e um elevado nível de proteção e melhoramento da
qualidade do ambiente. A insistente referência a este princípio no TUE nada vem
acrescentar às vinculações a que a União estava adstrita, estas são muito
lineares, e quer quanto aos meios e quanto aos resultados, nenhum deles se
assume como pressuposto de qualquer política ambiental, antes se conformam casuisticamente,
em função dos objetivos comerciais e económicos em presença, e sempre se
fundindo com o princípio da integração[6].
O desenvolvimento sustentável é um desenvolvimento que vai ao
encontro das necessidades das gerações presentes sem comprometer as
necessidades das gerações futuras, no entanto desde a sua aparição na Carta dos
Direitos Fundamentais, que este conceito é muito ambíguo, quer na definição das
políticas quer na sua fraca intensidade jurídica, existindo uma inclinação para
considerar este principio como uma meta essencialmente procedimental e não diretamente
acionável, comandado por diretrizes que incorporam a soft law.
Nas palavras da professora Carla Amado Gomes “o que se
pretende, é salvaguardar um determinado equilíbrio. Um equilíbrio entre os
valores ecológico – que não poderão ser postergados em nome de uma espiral
desenvolvimentista, mas também não deverão ser transformados no alfa e ómega da
política europeia – e os demais desígnios máxime económicos da União – que hão
de continuar a ser prosseguidos, embora de forma a não delapidar os recursos
naturais, nem pôr em causa o funcionamento dos principais ecossistemas.” Ou seja, a economia deve-se desenvolver de forma o menos lesiva possível para o ambiente
e a proteção do ambiente deverá ser prosseguida da forma mais económica possível.
É necessário existir uma lógica de equilíbrio e uma interconexão e interdependência
entre distintos valores, pois o bem-estar económico-social depende de uma saudável
vivência ecológica, tal como a conservação da natureza carece de determinado
desenvolvimento económico[7].
Pretende-se uma gestão racional dos recursos (principalmente dos não renováveis)
e esse é o objetivo que se encontra expresso no art 191/1, 3º travessão do TFUE
e que em última análise se reconduz a uma vertente proactiva do princípio da prevenção
alojado no art 191/2 do TFUE.
Uma das grandes novidades do Tratado de Lisboa consiste na introdução
de uma referência à temática das alterações climáticas (191/1, 4ºtravessao do
TFUE). Esta incorporação das preocupações acerca do efeito de estufa e suas consequências
não aparece desamparada em 2007, dado que no Protocolo de Quioto, a União Europeia
assume um compromisso mais ambicioso do que os restantes países[8].
As instituições comunitárias lançam assim um Programa Europeu para as Alterações Climáticas (ECCP) acompanhado de instrumentos jurídicos, entre eles o Comércio
Europeu de Licenças de Emissão (CELE) e o Pacote Clima-energia.
Relativamente ao primeiro, é inovador na medida em que
assenta numa lógica de mercado, em que existe um sistema que fixa um limite
absoluto às emissões de gases com efeito de estufa, conferindo aos operadores
flexibilidade, para de forma licita e segundo os seus próprios critérios empresariais,
poluírem mais, adquirindo as necessárias licenças de emissão, ou poluírem menos,
alienando as licenças em excesso. Existe aqui uma mão invisível do mercado que
assegura uma distribuição ótima da poluição em termos económicos, perseguindo
um resultado ecologicamente equilibrado.
Quanto ao Pacote Clima-energia, teve a sua essência no
Conselho Europeu de 2007, pela necessidade de se definir a política climática da
União para o pós 2012 (posterior à vigência do Protocolo de Quioto), e onde se
fixou um conjunto de metas a atingir até 2020, entre elas uma redução de 20%
das emissões de gases com efeito estufa face aos níveis de 1990; um consumo de
energia em 20% de fontes renováveis; aumento da eficiência energética em 20% e
um nível de incorporação de biocombustíveis de 10%. Ficando conhecida como a
decisão “20-20 em 2020”.
Assim em total coerência com o tema das alterações climáticas,
no Tratado de Lisboa decide-se singularizar a política climática,
atribuindo-lhe dignidade fundacional (ou constitucional para quem entenda que
os Tratados fundadores têm essa natureza). Verifica-se um reforço da associação
entre política de energia e ambiente, dado que a produção, transformação
armazenamento e transporte de energias não renováveis (logo escassas) provoca
efeitos negativos em termos de alterações climáticas, e em prol da resolução desse
problema, a consequente necessidade de
transição para um novo paradigma energético, com base em fontes limpas e renováveis.
A relevância do art 194/1 do TFUE não está tanto no seu conteúdo
mas no facto de passar a existir uma base habilitante, expressa e autónoma da política
energética, acompanhada do desenvolvimento de energias novas e renováveis.
nº 18292
Bibliografia
Gomes, Carla Amado; Antunes,
Tiago – Tratado de Lisboa “Cadernos o Direito nº5” – Almedina 2010
Gomes, Carla Amado – Textos dispersos de Direito do Ambiente –
AAFDL 2005
Gomes, Carla Amado – Introdução ao Direito do Ambiente –
AAFDL 2012
Martins, Ana Maria Guerra – Ensaios sobre o Tratado de Lisboa
– Almedina 2011
[1] Carla A. Gomes – Introdução ao
Direito do Ambiente (pág 49)
[2] Carla
A. Gomes in textos dispersos de direito do ambiente (pág 263 e ss)
[3] Carla A. Gomes – Introdução ao Direito do
Ambiente (pág 57)
[4] Carla
A. Gomes – Tratado de Lisboa (pág 32).
[5] Carla A. Gomes – Tratado de Lisboa (pág
35)
[6] Carla A. Gomes – Tratado de Lisboa (pág 44)
[7] Carla
A. Gomes – Tratado de Lisboa (pág 46)
[8] A generalidade dos países envolvidos comprometeu se entre 2008 e 2012 a reduzir
as emissões de gases em 5% face a 1990, já os 15 países comunitários vincularam
se a reduzir em 8%.
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